Os novos barões do café (XXIII) – A tragédia se abate sobre a Nação


A tragédia se abate sobre a Nação

Arnaldo Mourthé

O jogo de bastidores retomou forças em um quadro político de diálogo e negociação. Os governadores do PMDB, à frente Montoro e Richa, mais Brizola, do PDT, apoiaram imediatamente a candidatura de Tancredo Neves, o nome mais adequado para ocupar a Presidência naquele momento. Por sua honestidade, por seus princípios republicanos, por sua capacidade de conciliação, sem tergiversar no essencial. A votação da Emenda mostrou que a oposição dispunha de maioria e poderia, unida, vencer a eleição.

Os governistas viram isso com maior clareza que alguns oposicionistas. Enquanto o PT tomava posição contra a candidatura de Tancredo, José Sarney, que fora presidente da Arena e do PDS, duvidou da viabilidade da candidatura de Paulo Maluf. Sem ter poderes para impedi-la, ele aderiu a uma dissidência, a Frente Liberal, sob a liderança de Aureliano Chaves, Marcos Maciel e Jorge Bornhausen. Esse grupo negociou seu apoio a Tancredo em troca da indicação de Sarney, como vice-presidente. Isso feito, Sarney se filia ao PMDB. O PDS, braço civil da ditadura militar, perderia a eleição. Porém se manteria no poder através de um grande grupo liderado por Sarney.

Tancredo era um homem capaz de buscar a democratização do país e a restauração dos princípios republicanos. Era firme e sereno na adversidade, sem perder o equilíbrio e sem fazer concessões. Mesmo assim o PT decidiu não apoiá-lo. No grande comício das Diretas Já em Belo Horizonte, um grande grupo de militantes do PT ocupou o espaço imediatamente em frente ao palanque. Quando Tancredo foi chamado para seu pronunciamento, esse grupo puxou uma vaia. Tancredo, tranquilo, ficou calado por um momento, com o microfone na mão, como um caçador aguardando o momento oportuno para a ação. Ela foi simples e incisiva. Reunindo toda a força de sua voz ele disse:

– Minas!…

Fez uma longa pausa, à espera da reação do público. Enquanto a vaia se arrefecia, ele voltou a dizer:

– Minas!…

Outra pausa.

– Minas!…

A ovação da massa ecoou no concreto armado dos prédios da avenida Afonso Pena e espalhou-se pela cidade. Seguiu-se um grande silêncio. Tancredo retomou a palavra e disse o que tinha a dizer, tendo abaixo de si, em estado de perplexidade, o grupo que ali estava para vaiá-lo, desconhecendo a diferença entre uma causa nacional, de união de todos, e seus projetos partidários menores. Tancredo foi eleito presidente da República, em 15 de janeiro de 1985, com 480 votos, contra 180 dados a Maluf. Vinte e seis deputados se abstiveram, muitos deles do PT, que, entretanto, teve três deputados que votaram em Tancredo, Beth Mendes, Airton Soares e José Eudes. Estes tiveram que deixar o PT sob ameaça de expulsão.

No dia 14 de março de 1985, véspera da sua posse, Tancredo foi hospitalizado em estado crítico. Ele não pôde comparecer à posse, mas Sarney o fez, leu o discurso que Tancredo havia escrito para a ocasião e ficou como presidente interino. Tancredo morreu no dia 21 de abril de 1985, sem tomar posse. Sarney, ex-presidente dos partidos da ditadura, Arena e PDS, tornou-se presidente da República. Mas, de qualquer maneira, a situação era outra, e a batalha política de princípios continuaria. A Assembleia Nacional Constituinte de 1986 seria o fórum que definiria que sociedade os brasileiros queriam. Mas antes dela ser eleita, Sarney e sua equipe fariam algumas proezas. Felizmente havia um Congresso mais independente.

 

Rio de Janeiro, 22/12/2016

 

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