Arquivos de fevereiro, 2017

10, fevereiro 2017 2:19
Por admin

A bomba explode no colo de Dilma Rousseff

Arnaldo  Mourthé

Dilma Rousseff foi eleita pelo PT, em 2010, em substituição a Lula, do qual ela havia sido ministra, da Energia e depois da Casa Civil, em substituição a José Dirceu envolvido no escândalo do Mensalão. Quando no Ministério da Energia ela havia sido presidente do Conselho de administração da Petrobrás. Em um quadro de instabilidade do PT, que teve suas principais lideranças envolvidas no escândalo do Mensalão, ela tornou-se a principal opção do partido para suceder a Lula que tornou-se seu cabo eleitoral Apesar do escândalo, Lula manteve seu prestígio de líder popular e conseguiu levar Dilma à vitória na primeira eleição que ela se candidatou; Foi um feito político extraordinário.

Sua administração seguiu o caminho das anteriores, de entregar a política econômica do governo aos banqueiros, principais interessados nas decisões dos ministros da Fazenda e do presidente do Banco Central. Continuou, portanto, a política suicida que começou com Fernando Henrique sobre a qual falamos no capítulo sobre o neoliberalismo.

Sua ação estava em contradição com sua história de resistência contra a ditadura. Com a redemocratização ela inscreveu-se no PDT. Como tal ela foi secretária de Minas e Energia no governo do Estado do Rio Grande do Sul, quando o petista de Olívio Dutra foi governador em 1999 fruto de uma aliança no Estado entre os dois partidos. Quando a aliança se desfez ela se recusou a deixar o governo desligando-se do PDT e se inscrevendo no PT. Nesse ato ela assumiu seu destino, seja para o êxito que ela alcançou, chegando a Presidente da República, seja pela decepção do impeachment.

A contradição entre sua condição de resistente, contra a ditadura militar, e sua adesão ao PT que a levou a adotar a política neoliberal contra os interesses do povo brasileiro, causou espanto por parte de muitas pessoas, inclusive eu. Quando ela resolveu fazer a concessão de áreas do Pré-sal, para empresas estrangeiras, eu escrevi um artigo questionando quem seria ela. Nele eu fiz um ligeiro retrospecto sobre a história do petróleo no Brasil, intitulado Lembrete à presidente Dilma Roussef. Nele eu pedi uma posição clara dela:

“E a senhora, presidente Dilma”?

“Está mesmo disposta a entregar aos gringos o Pré-sal e as áreas de exploração do petróleo que restaram, depois de sua alienação a preço de banana pelos entreguistas Fernando Henrique e Lula? Ou vai despertar a guerrilheira da COLINA         e da VAR-Palmares, a quem o povo brasileiro confiou a Presidência da República?

“Qual o título que a senhora levará para a história”? A de entreguista ou a de guerrilheira-estadista, defensora da soberania nacional e do povo brasileiro?

“A escolha é de Vossa Excelência.”

Ela escolheu a primeira opção. Assumiu a responsabilidade das consequências que sua política traria, par o Brasil e para ela. Talvez pensando na impunidade, sob a alegação geral de “não haver alternativa”. De fato a alternativa poderia ser dolorosa, como o foi para Getúlio Vargas e para João Goulart. Mas coube a ela fazer a sua escolha. Se o fez para sua segurança fez a escolha errada. Quando a Operação Lava Jato revelou toda a corrupção que estava ocorrendo no Brasil, ela serviu de “bode expiatório” e foi cassada pelo impeachment.

Mas a corrupção não começou com o Lula. Na sua última versão, a de favorecer a política nefasta do capital financeiro internacional, ela já havia se revelado claramente e comprovadamente no Mensalão, com a compra de votos para as “reformas” contra os trabalhadores promovidas por Lula, e as ainda não plenamente reveladas na compra de votos, também no Parlamento, para aprovar as privatizações e a reeleição de Fernando Henrique. Na iminência da vinculação da corrupção com o projeto neoliberal, foi melhor para seus defensores oferecer em holocausto o sacrifício de Dilma, uma guerrilheira contra a ditadura, tentando restringir a corrupção à Petrobrás e às empresas de engenharia brasileiras, matando dois coelhos com uma cajadada só.

Isso porque a grande corrupção é a dos altos juros da dívida pública que foi construída para liquidar com a República, através do enfraquecimento do Estado e destruição dos serviços públicos. Se há dúvidas sobre isso, caro leitor, você poderá confirmar isso depois de conhecer a natureza e a realidade do poder que veio substituir Dilma e o PT. Prepare seu estômago, porque não será fácil saber tudo que vem a seguir nesse pequeno e singelo livro.

Rio de Janeiro, 05/01/2017.

08, fevereiro 2017 2:41
Por admin

Lula e marginalização da Esquerda

Arnaldo Mourthé

Nós já vimos como o PT foi criado, para bloquear o caminho da esquerda brasileira. Esta tinha como maior expressão eleitoral o trabalhismo desde Getúlio Vargas. Havia outras correntes políticas como os socialistas e os comunistas, que também deveriam ser barradas. Esta última corrente foi usada como justificativa, sem razão de ser, desse bloqueio. A questão era a de não permitir que a luta pela verdadeira República prosperasse no país, pois ela seria um obstáculo intransponível para o projeto de colonização do Brasil.

Lula e o PT haviam tentado por três vezes chegar a Presidência. A primeira contra Collor e as duas outras contra Fernando Henrique. Em 2002 houve a quarta tentativa. Tudo indicava que seria outro fracasso. Havia ainda uma consciência política que resistia às promessas e pirotecnias do PT. O PSDB indicou José Serra como seu candidato, com toda sua soberba e ar professoral que não tinha apelo popular. Para fugir à opção entre PSDB e o PT, que Brizola chamava de “escolha entre o diabo e o coisa ruim”, foi formada uma coligação entre PDT, PTB e PPS, sob a denominação de Frente Trabalhista.

O candidato escolhido foi Ciro Gomes, filiado ao PPS, homem simpático e com posições progressistas. Houve uma grande aceitação do seu nome. Nas primeiras pesquisas ele disparou na frente, chegando a bater os 30% da preferência popular. Apesar dos escassos recursos financeiros, houve a esperança de termos um presidente representando as forças políticas populares. Mas não foi assim. Ciro revelou-se um temperamental. Falou nele mais alto sua formação de quadro da oligarquia do Nordeste. Ele escorregou diante de provocações em um de seus eventos de campanha, menosprezando um interlocutor. A mídia não perdoou. Ele passou a ser mostrado como alguém sem estabilidade emocional para a Presidência. Alguns conflitos ocorreram com sua equipe que dirigia a campanha. Ciro despencou nas pesquisas, ficando em quarto lugar no resultado eleitoral. Sobraram Lula e Serra, que foram para a disputa no segundo turno. Estava colocada de novo a opção entre o diabo e o coisa ruim.

Essa questão afetou particularmente o PDT, que liderava a coligação através de Leonel Brizola. Que fazer diante daquele quadro desfavorável. A questão do PT fora discutida inúmeras vezes pelo PDT, sobretudo devido às dificuldades que o PT criava para nossas administrações. Lembremos a questão da eleição de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, quando o PT impôs a seus deputados a abstenção. Os sindicatos do PT eram vezeiros em bloquear as administrações públicas, que não estavam sob seu controle. Nós tivemos vários conflitos com eles, que não cabem ser analisados aqui. Mas era preciso tomar uma decisão sobre a participação do PDT naquele segundo turno. Minha posição foi pelo voto nulo, numa demonstração clara que aquela opção não servia ao País. Argumentei que o projeto do PT era, assumido o poder, ficar nele por cinquenta anos. O número de anos era uma força de expressão, ou seja, o PT queria o poder para sempre, ou pelo menos enquanto o Lula vivesse. Afinal Fidel não estava no poder há mais de 40 anos? A comparação é folclórica, mas na cabeça dos dirigentes do PT, as condições históricas e a sociedade não precisavam ser levadas em conta. Tudo era uma questão de oportunidade. Não foi por outra razão que o seu poder levou o País ao caos. Minha posição foi desprezada, pois havia outras questões em jogo, especialmente as eleições para os governos dos Estados.

O realismo político não era exclusividade do PT. Embora fossem mais autênticos, os outros partidos que representavam setores da sociedade e eram guiados, de uma maneira ou de outra, por uma ideologia, tinham que enfrentar uma realidade política adversa. Pressões locais ajudaram na decisão por uma aliança do PDT com o PT para o segundo turno. Sem ela o PSDB seria o grande vencedor das eleições daquele ano e o modelo neoliberal de Fernando Henrique se consolidaria.  A história mostrou que a escolha de Lula fora um erro político, que pode ser justificado pelas circunstâncias. Mas, o que seria, se não fosse assim? Se o Serra  ganhasse a eleição, tudo indica que não deveria haver quadro melhor do que esse tenebroso em que enfrentamos. Afinal, as causas produtoras do nosso caos social vêm do exterior.

Há no ar uma perguntae frequente, por que a esquerda no Brasil está tão fraca? Espero ter dado algumas informações para mostrar como isso se deu. Mas elas não são suficientes. O fenômeno também está ocorrendo fora do Brasil. A explicação mais completa dele é que estamos vivendo um momento surrealista em todo o mundo. A esquerda, desde a Revolução de Outubro na Rússia, ficou circunscrita à defesa dos direitos civis e dos trabalhadores em face da exploração do sistema capitalista.Tudo se desenvolveu em torno da discussão da divisão dos frutos do trabalho, entre trabalhadores e empregadores, em torno dos salários de um lado e da taxa de lucro do outro.

Não se cogitava de outras questões desse chamado mundo moderno da comunicação instantânea que movimenta o capital pelo Planeta, de forma estarrecedora, à procura de melhores rendimentos. Não se cogitava também de uma economia escrava de um sistema financeiro operando dinheiro falso, papel moeda emitido sem lastro, e fraudulentamente contabilizado sob a forma de dívidas públicas, forjadas para armazenar o dinheiro sem lastro, para que não circule, pois contaminaria a economia com uma inflação catastrófica, destruindo o próprio sistema. Além disso, a dívida pública coloca os governos em posição de vulnerabilidade pela incapacidade de pagá-la, ofereceram favores absurdos aos credores. Estes, organizados em torno de conglomerados bancários que dominam não apenas países periféricos como o Brasil, como os mais capitalizados, como o próprio centro do sistema, os Estados Unidos.

É diante desse quadro que deve ser pensada a militância política de nossos dias. Os velhos padrões e chavões, não funcionam mais, pois toda a sociedade é escrava do capital financeiro, que tudo domina, esmagando países, destruindo culturas, sacrificando povos, gerando a miséria e o sofrimento em um mundo em que as pessoas perderam a referência da realidade. Para isso usam todas as armas, das mais destrutivas do ponto de vista material às mais sutis, como a alienação através da comunicação sob as formas mais variadas. É contra esse estado de coisas que nós devemos atuar.

Mas vamos continuar nossa análise da história do poder no Brasil. Em seguida voltaremos a essa questão que é, sobretudo, a mais importante nos dias de hoje.

Rio de Janeiro,29/12/2016

 

06, fevereiro 2017 12:35
Por admin

O governo Lula

Arnaldo Mourthé

Lula não era um político burguês, nem um representante das oligarquias agrárias, ele era um líder sindical em um núcleo poderoso da indústria brasileira, o ABC paulista, onde se encontrava as maiores fábricas do setor automotivo. Esperava-se que seu governo deveria trazer mudanças significativas na política brasileira. Esse foi o tema central de seu discurso de posse. Ele disse: Mudança é a palavra chave. Mas fez algumas ponderações: Vamos mudar sim. Mudar com coragem e com cuidado. Com humildade e ousadia. Mudar com a consciência de que a mudança é um processo gradativo e continuado, não um simples ato de vontade, não um arroubo voluntarista. Mudança por meio do diálogo e da negociação. Sem atropelos ou precipitações. Para que o resultado seja persistente e duradouro.

A sua mudança, consideradas suas ponderações poderiam ser interpretadas como: cuidado com o andor que o santo é de barro. A advertência dele era adequada. Ele sabia que ele não iria mudar nada na sua essência. Apenas poderia negociar o atendimento de sua base eleitoral, dos trabalhadores, especialmente os metalúrgicos, e de setores da população mais humilde, com medidas compensatórias às condições desumanas a que eram submetidas. Daí ele balizou sua política social de defender os trabalhadores, com prioridade para aqueles do ABC da indústria automotiva, onde a produtividade dava melhores condições de negociais salariais e de melhores condições de trabalho. Em segundo lugar atender às reivindicações das Comunidades Eclesiais de Base, que lhe davam a sustentação da Igreja Católica, com toda a credibilidade que isso implicava. Em terceiro lugar atender aos menos favorecidos das regiões metropolitanas. Dessa política nasceram seus programas sociais, Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, etc. Buscou atender às classes médias com os programas de financiamento da educação e de incentivos culturais. Mas todos esses programas representavam pouco em relação ao apoio explicito à política de endividamento a juros escandalosos e a subvenções à indústria, especialmente à automobilista e à dos utensílios domésticos da conhecida como linha branca.

Lula já sabia de tudo isso quando saiu da Casa Branca, em Washington, onde fora fazer uma visita diplomática a Jorge W. Bush, antes de sua posse. Na varanda da residência oficial do presidente dos Estados Unidos ele anunciou oficialmente o primeiro nome de seu futuro governo, Henrique Meireles, que até aquele momento não tinha qualquer experiência profissional que não fosse de funcionário do BankBoston, no qual fez carreira chegando a seu presidente internacional. Ele havia sido eleito deputado federal pelo PSDB do Estado de Goiás, mas não chegou a exercer o cargo, e desligou-se do partido para participar do governo Lula. Naquele ato Lula aderiu ao projeto neoliberal da Wall Street, que abriu as fronteiras das nações ao capital financeiro internacional, submetendo países e destruindo suas economias e sua cultura, sua soberania enfim.

Tudo o que veio depois está profundamente ligado a esse evento. O Brasil que já havia se alinhado ao neoliberalismo com FHC, se engajava numa proposta política que iria levá-lo ao colapso financeiro, se considerarmos obrigatórios seus compromissos assumidos com os investidores detentores se seus títulos da dívida pública. O Brasil embarcara na rota do suicídio e a crise que se abateria sobre ele seria demolidora, como está sendo. Mas esse projeto neoliberal não é só isso. Ele é tudo aquilo que já descrevemos no capítulo anterior. A abertura do mercado e a submissão da política nacional às exigências dos investidores. Tudo  que vimos, revelados pela crise e pela Operação Lava Jato, já era previsível a partir daquele momento. Em meu livro, A Crise, estão transcritos um grande número de artigos que narram fatos ocorridos de 2001 até 2014, que revelam ações do seu governo que nos levariam ao desastre.

Como exemplo dessa ação citaremos apenas as políticas dos governos Fernando Henrique e Lula que criaram os grandes transtornos que envolvem a Petrobrás. Um dos objetivos dessas políticas era demolir os pilares da economia brasileira e da afirmação da capacidade empreendedora de nosso povo. Desmoralizar a Petrobrás é para eles seria quebrar nosso amor próprio enquanto cidadãos e retirar de nós um instrumento fundamental no desenvolvimento de nosso país. É desmoralizar as empresas estatais, criadas a partir do governo Vargas para construir um país com Soberania e Justiça Social. Isso faz parte do projeto global do capital financeiro apátrida de dominar todo o mundo através de sua economia, distribuindo a miséria, a alienação e sofrimento pelo planeta Terra. Sua principal arma é a corrupção.

A corrupção sempre existiu, em busca de favores específicos do poder público, mas foi circunscrita em bolsões, dando prejuízo aos cofres públicos, mas sem desestabilizar as instituições. Ela era uma prática das elites em busca de favores particulares, mas não comprometiam o poder que era do próprio beneficiário. Mas com as reformas constitucionais do governo Fernando Henrique e Lula, com a compra de votos de parlamentares, a situação da corrupção modificou-se radicalmente. Ela passou a beneficiar os investidores de fora, que não dominavam integralmente o poder. Mas tinham intenção de fazê-lo. Assim foi derramado quantidades enormes de dinheiro para corromper políticos e os formadores de opinião, para seu projeto macabro. O assalto às estatais é “o troco” do lucro do capital financeiro destinados aos seus colabores internos.

A impunidade daqueles atos contra os interesses da Nação encorajou quem estava no entorno do conchavo lucrativo de proceder da mesma maneira. A corrupção espalhou-se pelos poderes públicos e pela mídia que a dissimulava, tornando-se sistêmica. O exemplo da impunidade animou todos que dispunham de uma parcela de poder a usá-lo em benefício próprio. Aqui está explicitada a origem do caos moral, que se tornou político e financeiro, comprometendo as instituições. Se quisermos acabar com essa praga, temos de cortá-la pela raiz, no setor financeiro, na dívida pública que é a chave de toda a questão. Mas isso ninguém com poderes teve ainda a coragem de tentar fazer, nem mesmo de dizer. Ela começara pelo interesse do capital financeiro internacional de abrir para ele o mercado brasileiro, no quadro da política neoliberal – conhecida como globalização – para dominar o mundo.

Fernando Henrique, desde sua passagem pelo Ministério da Fazenda, em 1993, até sua saída da Presidência em 2002, tomou 23 medidas contrárias aos interesses da Petrobrás. Lula já encontrou o caminho preparado para a sua liquidação e trilhou-o, praticando outras seis medidas para sua liquidação. (Fernando Siqueira, A Política de Petróleo no Brasil, Projeto Brasil Trabalhista, Caderno  de Textos 6, Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini, 2006). Por outro lado fez da Petrobrás um instrumento de sua política de manter o PT no poder, envolvendo-a em um gigantesco aparato de corrupção que está sendo revelado pela Operação Lava Jato, e que deu início a uma devassa na política nacional que desmonta o aparato de poder das castas e oligarquias, econômicas e políticas, que dominaram a política brasileira por quinhentos anos com exceção dos governos entre  a Revolução de 1930  e o golpe militar de 1964, que uniu oligarquias brasileiras, militares e interesses internacionais.

Todo esse processo desenvolveu condições para a ocorrência de uma grande catástrofe nacional. Estava armada uma bomba de efeito retardado que iria explodir no colo da presidente Dilma Roussef, também do PT, que sucedeu a Lula, sobre a qual falaremos mais adiante. As finanças públicas colapsaram, gerando conflitos sociais incontrolados que ameaçam as instituições e a paz social. As autoridades e seus porta-vozes – todos comprometidos com o processo de degradação moral e ético – tentam debitar tudo isso à crise internacional do sistema capitalista, que existe, mas é apenas outro componente dessa história macabra. Nossa crise, a mais grave entre todos os países do mundo, não seria tão devastadora não fosse a submissão vergonhosa de nossos governos, desde 1995, aos interesses perversos daqueles que acumularam uma grande parte da riqueza mundial, em detrimento da humanidade, de sua liberdade, de sua saúde, de sua independência, de sua segurança e, até, em certos circunstâncias, de sua sobrevivência, distribuindo a miséria, a violência e a morte pelo mundo afora. Sobretudo nas áreas onde a riqueza é explicita, como nas produtoras de petróleo e gás. Conseguirão eles alcançar seus objetivos de dominar o mundo? Não conseguirão, e é isso que veremos mais adiante, nas nossas análises.

Rio de Janeiro, 26/12/2016

 

11:23
Por admin

Qual seria a natureza do PT e do governo Lula?

Arnaldo Mourthé

Comecemos recordando das condições que levaram à queda da ditadura. Nós vimos que o cenário internacional mudou no período de 20 anos da ditadura. Não era mais conveniente um governo militar incompatibilizado com a população, por sua covarde ação repressiva e um resultado econômico péssimo nos seus últimos anos como já vimos. Era preciso restaurar o processo democrático, mas havia um risco para os interesses do capital internacional e das castas dominantes da sociedade. Era preciso grande cuidado para que não voltassem ao poder aqueles que representavam a política de desenvolvimento com soberania e justiça social, como Brizola, ou os mais sofridos trabalhadores brasileiros, como os nordestinos que padeciam sob a prepotência dos senhores de terra, como Arraes. Também não queriam os mais ferozes membros da ditadura o retorno de um partido comunista, que ganhara prestígio com a resistência à ditadura, especialmente através de Marighela.

Dessa forma, nas discussões sobre a anistia, uma das condições dos militares era a exclusão dela dos três grandes líderes citados, todos ainda vivos e na memória das pessoas. Os parlamentares estavam cedendo à pressão dos militares, prontos a aceitar a exclusão daquelas lideranças dos benefícios da anistia. Mas uma forte reação ocorreu, dentro e fora do Brasil. Aqui as pessoas engajadas ou simpatizantes da luta contra as atrocidades do governo militar e, no exterior, os exilados, seus simpatizantes e parlamentares europeus que apoiavam a luta do povo brasileiro pela democracia. Esse apoio era também da imprensa europeia, principalmente, mas também na América Latina. Contavam os exilados com o apoio de países, com a Argélia, que lhes abrigava, assim com  Portugal a partir da Revolução dos Cravos de 25 de abril de 1974, e das ex-colônias portuguesas recém libertadas.

A imprensa francesa e a italiana davam ampla cobertura aos movimentos a favor da anistia. O jornal Le Monde publicava documentos dos exilados referentes ao Brasil da ditadura, chegando a ocupar meia página do jornal, em mais de uma feita. Os parlamentares italianos chegaram a criar uma comissão especial para acompanhar a luta pela anistia no Brasil e apoiar os exilados brasileiros. Muitas reuniões aconteciam em recintos importantes da Europa, como da La Mutualité Française, em Paris, onde muitos artistas ligados ao movimento se apresentaram e até houve ali uma conferência de Miguel Arraes, então exilado em Argel, com grande repercussão nos meios políticos e intelectuais da França. Na Itália ocorria a mesma coisa. No México havia um grande grupo de exilados, muitos professores universitários. Francisco Julião também encontrou ali seu refúgio. Realmente havia um risco de um líder popular de peso e engajado em defesa do nosso povo e da nossa nacionalidade chegasse ao poder central. Os parlamentares depois de fortemente questionados pelo movimento pela Anistia Ampla Geral e Irrestrita, tiveram que resistir aos militares, que acabaram cedendo.

Para os militares e as forças políticas reacionárias que os apoiavam era preciso encontrar um artifício para evitar que assumisse a Presidência da República um líder que colocasse em primeiro lugar a soberania nacional e os interesses do povo brasileiro. Era preciso criar um partido com cara popular, mas que aceitasse a política de interesse do grande capital. Esse partido foi o PT – Partido dos Trabalhadores. A primeira questão é que a eleição para presidente teria que ser indireta, através do Congresso Nacional. A eleição geral de 1982, para todos os cargos eletivos menos a presidência da República, mostrou que a preocupação dos militares tinha fundamento. Brizola ganhou no Rio de Janeiro e seu partido ganhou também no Rio Grande do Sul. Tudo indicava que Brizola poderia chegar à presidência da República, se não fosse ele, poderia ser outro com política semelhante à sua, o que era inadmissível para a oligarquia enquistada no poder sob a proteção militar.

Por outro lado, a oposição também viu sua possibilidade de chegar ao poder, e lançou-se numa campanha nacional pela eleição pelo sufrágio universal, sob a bandeira das Diretas Já. Mas a emenda constitucional que permitiria isso não passou no Congresso, onde ainda predominava interesses que não correspondiam aos do povo brasileiro. Caberia ao mesmo Congresso escolher um presidente civil à Presidência. Os militares colocaram com seu candidato, Paulo Maluf, figura polêmica que não conseguiu unir o PDS, partido do governo. Surgiu uma dissidência que se aliou a Tancredo Neves, candidato escolhido pela oposição, com a condição de ter na chapa a vice-presidência, para a qual foi indicado José Sarney.

Tancredo Neves foi o vencedor, mas morreu antes de assumir o cargo, deixando o lugar para José Sarney que havia sido líder do partido da ditadura, a ARENA, que depois da reforma eleitoral passou a chamar-se  PDS – Partido Democrático Social. É interessante notar que o PT se absteve da votação, sob a alegação de ser contra a eleição indireta. Apenas três deputados do PT votaram em Tancredo, Beth Mendes, Airton Soares e José Eudes. Estes tiveram que deixar o partido sob ameaça de expulsão.

A morte de Tancredo criou uma comoção nacional. Não faltaram especulações que ela poderia ser evitada e não o foi. Curiosamente ele havia escrito no seu discurso de posse, lido na por Sarney na sua posse, a expressão: restaurar a República e não pagar a dívida externa com a fome do povo. Depois disso, as suspeitas sobre uma morte não natural não são apenas teoria da conspiração.

Dadas essas premissas voltemos à análise da natureza do PT. Ele foi um partido nascido de um forte movimento sindical do ABC paulista, onde se concentrava a maior parte da indústria automobilística brasileira. Era um movimento mais corporativista que ideológico, Não tinha aquilo que os sociólogos chamam de consciência de classe. Mas defendiam seus interesses, nas condições objetivas em que se encontravam, de uma classe operária massacrada pelo arrocho salarial da ditadura. Mas ocupavam uma posição privilegiada, em relação a seus similares de outras indústrias com tecnologias mais pobres. Mesmo assim seus salários estavam longe de alcançar os patamares dos trabalhadores europeus ou americanos que faziam o mesmo trabalho. Só que as plantas industriais do Brasil eram antigas, nos Estados Unidos seriam sucatas. Mas eles não tinham consciência disso, e se satisfaziam com seus privilégios em face de seus semelhantes brasileiros de outros setores industriais.

O movimento sindical do ABC foi um pilar do PT. Ele tornou-se mais forte com a política social de Fernando Henrique Cardoso, que considerava todas as pessoas como simples indivíduos, não como cidadãos. Para ele as pessoas não eram unas, cidadãos, não importa a atividade que exercessem, mas produtores ou consumidores. Ao consumidor tudo, ao produtor o arrocho salarial, a redução de direitos, a desconsideração. Eram ora corporativistas, ora despreparados, ora insubordinados. Os que perdiam emprego eram incompetentes. O desemprego seria de responsabilidade do desempregado e não do sistema de espoliação que precisa dessa condição para praticar salários miseráveis. Culpar a vítima pelo delito, como se ela pudesse evitá-lo sem mudar a política que a vitimava. Outra política que aumentou a força desses sindicatos foi o tratamento dado pelo governo ao funcionalismo e aos assalariados das estatais. A pressão do governo contra eles os fazia buscar na luta sindical uma saída, embora precária, mas efetiva para cada ocasião. O pilar do PT se fortaleceu no funcionalismo e nos trabalhadores das estatais. A CUT, com seu suporte no ABC, tornou-se a maior central sindical do país, dando uma sustentação política importante para o PT, inclusive para dar-lhe uma imagem de partido popular.

Mas a força política maior do PT, aquela que lhe rendeu mais votos e respeitabilidade, provinha da Igreja Católica, através das Comunidades Eclesiais de Base. Ela deu ao PT um caráter assistencialista e estendeu seu poder à classe média. Deu-lhe também condições objetivas para representar, embora não ostensivamente, o patriciado nacional, na cidade. Nos rincões do interior, ela abriu-lhe o caminho para os deserdados do campo. Ali os autofalantes da Igreja, pregavam a favor do PT e contra Brizola, por exemplo, o que pude constatar no norte de Minas quando da campanha de Brizola à Presidência, em 1989. Consta que o PT foi criado por um entendimento da Igreja Católica, representada pelo arcebispo de São Paulo, Dom Evaristo Arns, assessorado pelo conceituado intelectual Cândido Mendes, com Golbery do Couto e Silva, estrategista político do governo militar e criador do SNI.

Dom Evaristo Arns se notabilizou pela criação das Comunidades Eclesiais de Base, que dava às populações carentes assistência material e espiritual.  Foi um baluarte no combate pelos direitos humanos, e pela defesa dos perseguidos políticos durante a ditadura militar. Teria contribuído decisivamente para o projeto Brasil Nunca Mais, que mostrava as monstruosidades praticadas pela ditadura, para que aquilo não voltasse a ocorrer de no nosso no país. Teve um trabalho social incansável e foi o fundador da Pastoral da Terra. Foi também um dos organizadores do movimento Tortura Nunca Mais. Ele, o cardeal do Rio de Janeiro Dom Eugênio Sales e outras autoridades da Igreja, salvaram milhares de refugiados dos países do Cone Sul, Uruguai, Argentina, Paraguai e Chile, fugindo da prisão e da morte da Operação Condor. Acordo secreto entre esses e o Brasil, para a perseguição dos oposicionistas às ditaduras militares desses países.

Essas informações nos ajudam a compreender o fenômeno do PT, um partido sem ideologia definida, que ganhou enorme representatividade, mas se arrebentou no confronto com a realidade política do projeto de conquista do mundo pelo capital financeiro mundial, comandado da Wall Street, em Nova York, tendo como coadjuvante a  City de Londres, e se envolveu no mais escabroso processo de corrupção que o Brasil conheceu

Rio de Janeiro, 25/12/2016.

02, fevereiro 2017 11:15
Por admin

O governo Lula e o PT

Arnaldo Mourthé

             O PT foi um fenômeno impar na história política do Brasil. Por muito tempo houve interpretações diversas sobre sua natureza, que só agora começam a ser reveladas. Mas, as informações de conhecimento público são insuficientes para uma compreensão maior desse fenômeno. Para tentar revelá-lo comecemos por meu artigo  A devassa e a faxina, publicado em 26 de julho de 2005, quando eu escrevia sobre o Mensalão, escândalo de corrupção que envolveu ministros e dirigentes da cúpula do PT. Vamos ao artigo:

“A promiscuidade entre dirigentes do PT, autoridades exponenciais do governo Lula, alguns partidos políticos e diversos parlamentares com o capital privado, revelada pela CPMI dos Correios, estarrecem em entristecem as pessoas de boa fé. É preciso que a devassa seja profunda para apresentar os fatos e seus responsáveis à opinião pública e que venha em seguida uma grande faxina nas instituições envolvidas nos escândalos, condição essencial à sua reconstrução, tornando-as renovadas e sadias.

Não há especulação, por mais fantasiosa que seja, sobre a desonestidade de homens públicos, comparável com o que estamos assistindo pela TV e lendo nos jornais. Esse é um momento em que a realidade supera a ficção. Mas nada acontece por acaso. Tentemos compreender, pelo menos um pouco, como isso pôde acontecer. Que partido político é esse que não teria tomado conhecimento desses fatos escandalosos, como dizem muitos de seus dirigentes? Que não pôde ou não teve coragem de barrar a trajetória dessas figuras patéticas que manipularam, pelo menos por dois anos e meio, dezenas de milhões de reais, como protagonistas do maior escândalo de corrupção registrado pela história do Brasil?

“Essas questões ficam mais claras lendo-se a entrevista de Olívio Dutra, então ministro das Cidades e ex-governador do Rio Grande do Sul, concedida a O Globo e publicada em 16 de julho último.Sobre o PT ele disse que “Lá no início do partido, era um grupo de movimentos sociais, de setores sindicais que lutavam contra a estrutura sindical, contra a ditadura, e organizações de base para ser um partido que incorporasse outras sociedades comprometidas com a luta democrática, com uma política sem toma lá da cá”. Mais adiante ele acrescenta: “Depois, o PT começou a ganhar espaço de poder. (…) Mas aí, no meu entendimento, ele começou a abrir a guarda” (…) Mandatos de parlamentares passaram a ser instâncias partidárias (…) Um gabinete tem aumento enorme que suplanta a institucionalidade”. Apesar da imprecisão de linguagem, Olívio Dutra oferece, por sua autenticidade, pistas importantes para a compreensão da natureza do PT e o porque ele se envolveu em tamanha cumplicidade com o capital financeiro.”

Vamos à primeira questão, a formação do PT, “era um grupo de movimentos sociais, de setores sindicais que lutavam contra a estrutura sindical, contra a ditadura”. É esclarecedor o fato dele colocar a estrutura sindical e a ditadura na mesma condição de adversário, uma postura sem compromissos com classes sociais, com a nacionalidade ou com qualquer doutrina política. Apreende-se do que foi dito, e do que não foi explicitado, que o PT não tinha nenhuma ideologia quando foi criado. Não defendia o trabalhador, nem o burguês, nem a monarquia, nem a república. Apenas contrapunha-se à ditadura e se dizia democrata. Entendemos das palavras desse ilustre e graduado quadro do PT, que este é um aglomerado de “movimentos”, grupos de pessoas que lutavam contra o poder, seja dos militares, seja da liderança sindical de então. Se era somente isso, esse aglomerado não passava de saco de gatos.

Depois, o PT começou a ganhar espaço e poder. (…) Mas aí, no meu entendimento, ele começou a abrir a guarda. Mandatos de parlamentares começaram a ser instâncias partidárias (…) Um gabinete tem aumento enorme que suplanta a institucionalidade”. Traduzindo em miúdo, o saco de gatos cresceu, nele foram introduzidos novos gatos, poder local e gabinetes de parlamentares que suplantavam instâncias partidárias. Isso quer dizer que o PT não chegou a ser, em nenhum momento, ou apenas por curto período de tempo, uma instituição. Não havia um interesse coletivo a defender, dos militantes ou filiados que fosse, mas apenas interesses particulares de dirigentes partidários, autoridades locais, parlamentares e outras bases como a estrutura sindical, a CUT, que substitui a outra que o PT combatia, mas, talvez, mais arbitrária ou ditatorial que ela. Voltemos ao artigo mencionado.

“Esse é um dos motivos pelos quais foi possível criar dentro da direção nacional do PT um grupo de negocistas e corruptores que cometeram a mais grave de todas as variedades de corrupção, aquela do legislador, para fazer leis a favor do capital, contra os interesses dos trabalhadores e da nação. Querendo ou não, o PT agiu no sentido de destruir a República, a maior das instituições, mãe da nacionalidade cidadã, que a vontade soberana do povo estabeleceu. Se o quis é grave, se não o quis é mais grave ainda, pois estava a serviço de outrem, sabe lá quem. Talvez o conhecimento da origem primeira do dinheiro da corrupção venha esclarecer essa questão.

“A infeliz declaração do Presidente, dada diretamente de Paris, “O que o PT fez, do ponto de vista eleitoral, é o que é feito no Brasil sistematicamente”. Ou seja, reconheceu que o PT é igual àqueles que cometem ilegalidades, e que o ilícito penal é prática corrente, portanto aceitável. Vinda do Presidente da República a declaração é de extrema gravidade, pois admite a prática da ilegalidade, quando uma das missões mais inerentes ao cargo é coibir a ilegalidade. Além disso, ele dá um péssimo exemplo a todos, sobretudo aos jovens que já se encontram desamparados com sua política de desemprego e de arrocho salarial. Uma afirmação despropositada e inaceitável.

“Diante de todo esse quadro, os homens íntegros e boa vontade que pertencem ao PT, que são muitos, têm pela frente a tarefa gigantesca de completar a demolição que os escândalos produziram e fazer uma limpeza geral nos seus quadros. Isso para começar, porque também é necessário ao partido assumir um compromisso com algum setor da sociedade, à sua escolha, mas é essencial mostrar sua verdadeira face e representar com lealdade e altivez esse setor. Ter uma ideologia é fundamental para um partido político. O exemplo está aí à mostra, o próprio PT em desagregação, que sem compromissos sociais entregou-se aos encantos do capital financeiro. Esse, nas suas facetas, nacional e internacional, se empenha em mudar as regras institucionais e de setores sociais para aumentar ganhos financeiros, e submeter o Estado nacional, com o objetivo de controlar nossas riquezas e nosso próprio território, para fazer do Brasil uma nova colônia. Vejam as leis que entregam nossas riquezas e nosso território, como as das concessões de áreas de exploração de petróleo e de milhões de hectares da floresta amazônica ao capital estrangeiro.

“Se esses homens íntegros e de boa vontade do PT, não puderem ou não tiverem a coragem necessária para fazer o que é preciso, a sociedade cumprirá seu dever. Enterrará de vez o PT e sua triste história.”

Mas tudo indica que naquela época isso não ocorreu, senão algumas defecções de quadros representativos do PT, que se sentiram sem condições de manter-se no partido depois daquele escândalo. Assim a atividade corrupta e predatória do PT persistiu até que ocorreu a “Operação Lava Jato”, que está produzindo uma verdadeira devassa na política nacional e nas empresas e instituições envolvidas na mais escandalosa e devastadora rede de corrupção do país.

Mas essa é uma questão das áreas judiciais e policiais, que não nos cabe analisar em minúcias, quando nosso escopo é a investigação da história do poder no Brasil. Por isso voltamos à nossa questão sobre o governo Lula.

Rio de Janeiro, 24/12/2016

 

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