Nosso poder está dentro de nós mesmos
Arnaldo Mourthé
De tudo que temos assistido em relação ao comportamento humano no Brasil, nos parece claro uma grande contradição entre nossas necessidades e a ação do poder político institucionalizado. De um lado um poder tirânico desmantelando as instituições, o serviço público, e os direitos de cidadania. De outro um povo em estado de perplexidade diante dos fatos, que pouco tempo antes seriam impensáveis.
Os homens que estão no poder e que lá chegaram por um golpe de mágica, sem votos e sem a confiança popular, defendem uma política dos “investidores”, e se arvoram na condição de mandantes em uma sociedade que mal conhecem e com a qual não se identificam, nem consideram. Seus critérios são seu egoísmo e o menosprezo pelos seres humanos que aqui habitam. Seu valor supremo é o dinheiro, que consideram sagrado. Sua política é a de uma entidade fantasmagórica chamada “mercado”, sua máscara, que lhes serve de manto para justificar medidas absurdas contra a condição humana, dos nativos ou para aqui migrados. Seu objetivo é satisfazer os interesses dos senhores do mundo, que se dizem civilizados. As “virtudes” que os movem é o egoísmo e a soberba.
Do outro lado da contenda estão os pobres mortais sujeitos ao menosprezo e à submissão. Esses são a grande maioria do povo, quase sua totalidade, em suas mais variadas formas existenciais. Eles formam uma grande diversidade de seres vivendo diversas situações e com diferentes visões do mundo. Na sua simplicidade, mesmo quando instruídos, todos têm seus interesses a defender, em particular, e se esquecem que são membros de uma grande e poderosa comunidade, chamada Nação. Dessa forma cada um se vê como diferente dos seus iguais e se limita a defender seu interesse particular, sem considerar que ele só poderá ser realmente defendido com a união da comunidade. Foi esse entendimento que levou os homens a criar uma instituição para se defenderem juntos, a República, quando perceberam que separados seriam escravizados pelos impérios. Desta forma, as pessoas acabam por digladiarem, em defesa de falsos interesses e falsos líderes, o que as leva à condição de indefesos, como o são no momento histórico que vivemos no Brasil.
Isso permite ao outro grupo, o opressor, unido através do seu interesse pecuniário, impor-se e submeter-nos ao desamparo, destruindo a República através do desmantelamento do aparelho do Estado, suas instituições e sua administração. Essa situação levou-nos ao caos em que estamos mergulhados, que induz muitos a admitir que não poderá ser superado pelos cidadãos. Há por isso perplexidade, impotência e até desespero, com consequências terríveis que não valem a pena mencionar. Mas será de fato essa situação um impasse, ou um labirinto do qual não se pode encontrar a saída? Não, há a possibilidade de vencermos os predadores que querem dominar o país e já o fazem setorialmente, seja na economia, seja na sociedade. Mas como? Vejamos isso.
Há um ditado oriental que diz “conheças o inimigo e a ti mesmo e travarás mil batalhas sem derrotas”. Ele não afirma que todas as batalhas serão vencidas apenas com esses conhecimentos, mas indica que você escolherá a batalha a travar e as condições em que nelas se possa vencer, ou fazer o inimigo recuar. Mas, se não sabemos quem somos e muito menos conhecemos nosso inimigo, não teremos a oportunidade de vitória, pois nem saberemos quais as batalhas que nos seriam convenientes.
Assim é fundamental conhecer o inimigo, sua força e sua fraqueza, e fazer o mesmo conosco. Nós já identificamos o inimigo no cabeçalho deste texto. Precisamos conhecer também o que somos e analisar os pontos fortes e os fracos dos dois lados. A força dele está em ter objetivos bem claros e ter-se organizado desde muito tempo para a realização de seu projeto. Este é a conquista dos países através do desmantelamento das suas instituições. Isso, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo que lhe interessa, nesse momento histórico em que vivemos. São aqueles países onde já funciona o sistema capitalista e que tenham alcançado certo nível de desenvolvimento tecnológico. O Brasil é um de seus grandes objetivos porque, dominado, facilitaria o domínio de toda a América Latina, que seria sacramentada como o grande quintal da América do Norte, nos termos da doutrina Monroe, de 1823. Mas o projeto é maior que isso, pois não se limita ao Império americano, pois é um projeto do imperialismo financeiro, que é internacional. Definindo com maior clareza o inimigo, podemos avaliar sua força, que é extraordinária, o que leva muitos a crer ser impossível vencê-lo.
Mas, só pensa assim aquele que não vai a fundo na análise da questão do poder. O que é o poder do Estado e como ele está hoje constituído. Ele provém da força do povo, dos cidadãos, se ele é republicano, assunto que merece longa consideração que não cabe nessa pequena abordagem. É por isso mesmo que eles querem destruir a República, acabando com o poder que emana do Cidadão. Teríamos no seu lugar uma tirania, que já começa a ser ensaiada no governo que temos hoje no Brasil, o Governo das Trevas.
A nossa força política, enquanto mantivermos a República, eles não podem superar. Vejam por exemplo a Operação Lava Jato, que gostariam de enterrar, mas ainda não conseguem, Mas o conseguirão se não houver uma força política capaz de freá-los. A grande luta, portanto, se trava em questões de conceitos, em definições de valores, de paradigmas. Ela é, portanto, uma luta ideológica e filosófica, que a grande maioria da população não compreende, o que a leva a acreditar que é possível confiar em um salvador da Pátria, que cada grupo define a seu bel prazer. A mídia, ou seja, a grande imprensa eletrônica ou escrita, desempenha um papel decisivo nessa história. Sem sua ação quotidiana e intensiva de desinformação e divulgação de mentiras não se criaria a condição para o descalabro que estamos vivendo no Brasil, a alienação geral.
Vamos então aos valores, para mostrar como é possível derrotar o monstro que nos amedronta e que está desmontando não apenas o Estado brasileiro, como nossa própria sociedade. A arma que o vencerá será nossa reflexão, individual e coletiva, sobre conceitos e comportamentos de submissão que eles nos incutiram através dos meios de comunicação e outros, como a própria Escola. Vamos a alguns deles e aos que devemos contrapor-lhes para nos resguardar.
Querem nos induzir à discriminação, o que nos divide, e que nós devemos responder com nossa Tolerância, que nos une. Pregam o egoísmo, que cria castas, e nós respondemos com a Caridade, como ensina a Fraternidade. Tentam nos convencer que a violência é de responsabilidade somente do indivíduo que a pratica, quando sabemos que a maior parte dela tem origem na injustiça, portanto pode ser combatida com Justiça social, que gera um clima de Paz, que é nosso objetivo. Pregam a ambição como se virtude fosse, quando sabemos que a virtude real é a Generosidade. Usam a soberba como forma de demonstrar superioridade, quando a virtude é a Humildade. Tentam nos impor o medo, para nos acovardarmos, quando sabemos que as conquistas se fazem com a Coragem. Não importa o nome estranho do Presidente, porque não temos nada a temer. Eles querem nos dominar, o que devemos responder com nossa Liberdade, no comportamento individual e nos protestos coletivos. Usam a mentira para nos enganar, que desmascaramos com a Verdade, que Jesus de Nazaré disse que nos Libertará.
Criam para nós toda sorte de fantasias, que devemos contestar expondo a Realidade dos fatos. Praticam uma política de injustiça social, o que respondemos com a Justiça. Nos administram a ignorância através da desinformação para alienar-nos, enquanto nós buscamos a Sabedoria e a Educação. Estão transformando o país em um campo da doença e da morte, que ocorre até em frente aos hospitais, quando nossa resposta é a Saúde e a defesa da Vida. Estão degradando a Natureza e as relações sociais, com suas práticas predatórias nos dois campos, o que devemos combater com a Preservação da Natureza e o Respeito às nossas Comunidades. Tentam destruir nossa Nação, mas responderemos com sua Reconstrução. Jogam os setores da sociedade uns contra os outros induzindo às disputas e à vingança, o que respondemos com o Perdão. Não são nossos inimigos aqueles que discordam de nós, apenas um ou outro lado deve estar enganado. Semeiam o ódio, o que respondemos como a Amor. Procuram nos convencer que outros povos são superiores a nós, o que contestamos com a Igualdade entre os homens. Querem nos dominar, mas nossa luta será sempre por nossa Liberdade.
Com esse arsenal ideológico e filosófico estaremos aptos a neutralizar e por abaixo o Governo das Trevas. Mas devemos ter cuidado para que aventureiros não se apoderem da nossa causa, ou velhos líderes se apresentem arrependidos para que lhes seja dado nova oportunidade. A opção de cada político já foi feita por eles mesmos. Precisamos de pessoas descomprometidas com o processo que nos levou á tragédia em que estamos mergulhados. Tudo isso depende apenas de nós mesmos.
A liderança adequada surgirá no próprio processo da resistência e da reconstrução da Nação. Que assim seja!
Rio de Janeiro, 29/3/2017.