A sociedade capitalista desmorona


A sociedade capitalista desmorona

“O Rio de Janeiro continua lindo”!

Arnaldo Mourthé

Há uma campanha orquestrada contra o Rio de Janeiro. Aproveita-se da deterioração da administração do Estado para intervir na segurança pública, com uso das Forças Armadas, por motivos pouco claros. Não é preciso grande conhecimento sobre a questão da segurança para sentir que há uma manobra satânica por traz de tudo isso. Não necessito fazer qualquer demonstração sobre a inadequação da medida para resolver a questão a que ela se propõe. Muitas já foram as manifestações a respeito. Limito-me a citar o artigo, no relançamento de O Jornal do Brasil, em 25/02/2018, do advogado criminalista Nilo Batista, professor universitário e figura inquestionável como profissional do direito e cidadão. Ele foi vice-governador, quando exerceu a Secretaria de Polícia Civil, depois governador do Estado.

A medida do governo federal é uma excrescência, concebida por um tresloucado ou jogador audacioso na busca de uma solução para sua situação de calamidade pessoal. Mas pode e deve ser mais grave que isso. Temer preside um governo de faz de conta. Ele não governa. Apenas administra os interesses dos grandes investidores internacionais que desenvolvem, há muito tempo, um projeto de completa dominação do Brasil, no quadro de outro projeto maior, tresloucado, de conquistar o mundo e implantar a chamada “Nova Ordem Mundial”. Essa seria a desordem completa da sociedade humana, sua extinção enquanto sociedade organizada sob a forma republicana. Nela não haveria cidadania nem soberania nacional. A remuneração do trabalho seria miserável, como é a tendência no nosso país depois da destruição da legislação trabalhista. Os países seriam plataformas de produção. governados como um latifúndio por feitores e bate-paus, à semelhança do sistema escravistas dos primeiros séculos da formação do Brasil.

Colocada dessa maneira, a afirmação acima parece uma ficção, mas não é. Ela é um retrato fiel desse projeto, baseado nos princípios bem claros do liberalismo primitivo formulado nos primórdios da civilização industrial. Esse foi firmemente combatido pelo pensamento crítico dos filósofos do século XVIII, conhecidos como os iluministas, especialmente por Rousseau, autor do precioso livro O contrato social. Todas as ideologias que defenderam os trabalhadores, e não apenas os assalariados fabris, nasceram da necessidade de defender o ser humano das atrocidades da filosofia liberal e do modelo espoliador do modo capitalista de produção. Elas foram desenvolvidas a partir do pensamento crítico, de escolas filosóficas que buscavam a verdade, enquanto a sociedade capitalista se desenvolvia amparado na mentira.

Houve um grande embate filosófico e político que durou mais de dois séculos, enquanto ocorriam muitos conflitos, incluindo as grandes guerras mundiais que sacrificaram centenas de milhões de pessoas, entre mortos – inclusive em fornos crematórios – feridos, refugiados, prisioneiros torturados e enormes perdas materiais.            As guerras, não só mataram dezenas de milhões de pessoas, como destruíram nações, enquanto os capitalistas ficavam mais ricos com elas. Nada mais natural, pois elas foram feitas para queimar os estoques de mercadorias invendáveis, resultado da acumulação capitalista. Essa questão foi amplamente analisada no meu livro História e colapso da civilização, Editora Mourthé. 2012. O momento que estamos vivendo é o do colapso do sistema capitalista e da sociedade desumana que ele engendrou, do colapso da civilização.

Para tentar salvar o sistema, a grande burguesia, controladora do mercado financeiro mundial, fez renascer o liberalismo primitivo, no qual a liberdade é defendida apenas para o capitalista, renegando as outras classes sociais a posições subalternas, desde serviçais de alta estirpe, regiamente pagos para administrar seus negócios e sua política, até os escravos que produziram as riquezas nas colônias das Américas no período do mercantilismo e fizeram enriquecer comerciantes e banqueiros e, ainda, financiaram a Revolução Industrial na Inglaterra, fazendo dela o maior império colonial do Planeta, onde o sol nunca se punha.

A Revolução Industrial, que potencializou e diversificou o sistema produtivo, gerou muitas necessidades que exigiam profissionais especializados, conhecimentos técnicos e científicos, administradores e gestores. Foi necessário ampliar o aparato estatal e todos os serviços complementares à produção. Esses novos profissionais, em função de suas tarefas, tiveram maior ou menor remuneração. Formou-se uma classe intermediária entre os capitalistas e seus operários que executaram suas tarefas nas unidades produtivas. Daí surgiu uma grande classe média, que a grande burguesia educou para seus serviçais privilegiados, no processo espoliativo da mão de obra e da Natureza. Aos operários e prestadores de serviços manuais foi reservada a miséria e à classe média uma vida mediana, como seu próprio nome indica. Esse foi o quadro social daqueles que se ocupavam, direta ou indiretamente, das atividades produtivas e de serviços. Assim se formou a sociedade capitalista na qual vivemos. A inteligência humana não se conformou com essa sociedade de desiguais. Houve conflitos de interesses e grandes embates.

A história do poder político da burguesia começou pela Inglaterra, numa aliança com a nobreza, através do rei Carlos I, quando da restauração do poder real, em 1660, depois da morte do líder revolucionário Cromwel. Carlos I era um absolutista, mas seu reino precisava, para governar, do poder econômico da burguesia. Esse governo de coalizão de interesses deu início à civilização industrial que agora agoniza. A partir dessa aliança, a monarquia constitucional, a burguesia usou o Estado para conquistar mercados para seus produtos.

A concorrência com a produção artesanal foi demolidora dentro da Inglaterra e, depois, fora dela com a expansão do capitalismo pela Europa. Logo ocorreram os embates da concorrência por mercados, já que o capitalismo para sobreviver precisa continuamente de novos mercados. Desses embates surgiram tensões que se deterioraram em guerras. Essas destruíam aquilo que os capitalistas produziam, gerando lucro para eles. As guerras são destrutivas para os povos, mas lucrativas para os capitalistas, uma fonte para desovar seus estoques retidos por sua contradição interna, a da acumulação capitalista, e pagas por todos, pelos cidadãos e Estados, ou seja, pela população que paga os impostos. O lucro retido pelo capitalista produz um desequilíbrio entre o custo e o preço da mercadoria colocada à venda. Esse desequilíbrio gera os estoques não vendáveis, que necessitam mercados novos para sua colocação. Na sua ausência, a solução é o financiamento ao consumidor, que gera juros e enriquece os banqueiros. A necessidade de novos mercados levou ao colonialismo e às guerras. O financiamento do consumidor levou à inadimplência e à crise financeira.

As bombas atômicas que destruíram Hiroshima e Nagasaki criaram um grande problema para a solução das crises do capitalismo. A guerra tornou-se um risco de destruição da humanidade. Sem uma grande guerra, o capitalismo, por sua natureza concentradora de capital, não tem mais como superar suas crises através da dissipação nos campos de batalha dos estoques acumulados,. O capitalismo entrou em crise sistêmica. Não há mais como sustentar a sociedade plural formada nos confrontos de interesses entre classes sociais e nações.

Como um coelho retirado da cartola, os ideólogos do liberalismo formularam aquilo que eles denominaram neoliberalismo. Um modelo que liquida o Estado de Bem Estar Social, conquistado pelas lutas das sociedades, em especial após as catástrofes das grandes crises e guerras mundiais. O neoliberalismo gestou um modelo de sociedade que liquida a cidadania e a soberania nacional, ou seja, a República. Rompe as fronteiras dos países buscando transformar as nações em colônias e suas populações em servos ou escravos, como existiu no colonialismo. O mundo dele seria aquele sem fronteira ente nações, mas com liberdade restrita para o ser humano. Para o proprietário, seu capital e suas mercadorias, não há fronteiras. Para o cidadão elas continuam existindo, com revistas humilhantes e até muros. Foi esse sistema que conduziu à concentração da riqueza nas mãos dos grandes capitalistas e ao endividamento dos países, subordinando-os a seus credores.

Segundo o FMI, as dívidas privadas e públicas mundiais correspondiam em 2015 a 2,55 vezes o PIB mundial. As dívidas públicas respondem por 85% do PIB, enquanto as dívidas privadas, de pessoas físicas e jurídicas, montam a 100 trilhões de dólares. Ou seja, 2,55 vezes aquilo que todo o mundo produz em um ano, pertencia ao capital financeiro em 2015. Esse valor só aumenta. A propriedade de todos esses créditos torna um pequeno grupo de investidores senhores das finanças, da economia e da vida das nações, através de seus governos submissos, pela pressão dos credores e pela corrupção patrocinada por eles.

Nossa dívida pública nos custa, em juros, 50% do orçamento da União, desorganizando a administração e os serviços públicos. O Tesouro Nacional gasta, por dia, um bilhão de reais de juros e emite outro bilhão de reais de títulos, apenas para pagamento dos juros da dívida. Os estados e municípios atrasam os pagamentos dos seus funcionários e têm seus serviços deteriorados por penúria financeira. Essa situação faz o governo ajoelhar-se face aos  credores. Essa é a causa principal da crise da segurança em quase todo o Brasil. No entanto, não se vê nenhuma menção na mídia sobre os segredos dessa calamidade. Na verdade, nossa dívida tem sido parte essencial do projeto de transformar-nos numa colônia. A intervenção federal no Rio de Janeiro também faz parte dessa trama. A missão de Temer, o impostor, é a de transformar o Brasil em um grande latifúndio dominado pelos donos do capital, uma máfia, pior que isso, pois são eles os criadores da máfia e de toda sorte de sociedades, secretas ou não, que visam colonizar todo o planeta.

O nosso maior inimigo não são as quadrilhas que operam nos bairros pobres, onde moram trabalhadores mal remunerados e marginais da economia, todos apartados da sociedade pelo desemprego e pelos salários miseráveis, quando conseguem emprego. Os bandidos, que os potentados chamam de “crime organizado”, são pobres diabos produzidos por uma sociedade perversa que despreza o ser humano. Os cidadãos não estão na origem dessa perversão. Aqueles que cumprem seus deveres na sociedade, de trabalhar e acatar as leis e a moral vigente, não são responsáveis por isso. Eles são vítimas, pois são desinformados, alienados, por um aparelho de propaganda perverso. O grande capital controla tudo, especialmente a comunicação. Usa a mídia para desinformar a população e submetê-la a seus interesses, e os meios de comunicação eletrônicos entre as pessoas para espioná-las. Eles materializaram as previsões do escritor George Orwell, autor do livro O grande irmão, cujo personagem principal é o sistema que controla todos os passos das pessoas. O grande irmão atual quer nos controlar com chips, através do documento de identidade único, que poderá localizar-nos a qualquer momento. Tentarão controlar até mesmo nosso pensamento.

O crime organizado está no sistema financeiro, no nosso governo, infelizmente, e na mídia que difunde o medo. Este imobiliza as pessoas e impede que elas tenham pleno poder de raciocínio, e se sintam inseguras para tomar decisões. Assim se deixam enganar. Pensam ser mais seguro seguir os conselhos da mídia mercenária a serviço do dominador. O que estão fazendo, sob a desculpa de proteger as pessoas do crime organizado é, na verdade, uma armadilha para captar as pessoas, retirar delas qualquer capacidade de movimento e de discernimento para conhecer a verdade. Isso me faz lembrar uma frase pronunciada há dois mil anos por Jesus de Nazaré: Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.

Rio de Janeiro, 28/02/2018

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