O segredo do colapso da civilização – Parte I – Histórico


Vivemos um momento de difícil compreensão. Parece não existir mais lógica na maneira de pensar das pessoas. Tudo que considerávamos correto, a pouco tempo atrás, não condiz em nada com a linguagem dos comunicadores da mídia, nem com os argumentos dos políticos que dirigem o país. Muitos dos respeitáveis homens que dirigem nossa sociedade, nossa economia, nossas empresas e corporações patronais, repetem a mesma linguagem incompreensível e enganosa. Na televisão, aqueles que se intitulam jornalistas pontificam, transmitindo as mesmas barbaridades, sugerindo nos informar. Mas essas informações não fazem sentido, pois conflitam com aquilo que consideramos correto, e assim era visto pela maioria da sociedade, há bem pouco tempo. O que está acontecendo conosco?

Há uma confusão de conceitos sobre a sociedade, sobre a política e sobre o comportamento humano. No topo da sociedade graça a tendência ao totalitarismo. Os políticos no poder tendem para a tirania, na qual são renegadas a leis que se destinam a regular as relações na sociedade. Só passa a ter valor a vontade do tirano, uma subversão de valores. Isso fica evidente quando se trata da economia, da produção e da distribuição da riqueza produzida.

Só parte da riqueza que produzimos remunera o trabalho e paga os tributos que deveriam sem aplicados nos serviços de interesse da população, como educação, saúde e segurança pública. Há um excedente que é apropriado por um grupo pequeno de pessoas. Essas vivem do lucro e de rendas diversas, algumas delas derivadas da produção de mercadoria ou de meios ou atividades ligadas ao processo produtivo, como o aluguel. Esse é o mecanismo normal do sistema capitalista. Mas há aquela renda, proveniente de juros da dívida pública e da especulação, que cria fortunas fabulosas sem origem na produção, que hoje sufocam o mundo da produção.

Nesse processo a sociedade se esfacela. As relações sociais são abaladas pela desorganização daquilo que, embora não fosse justo, era admissível, porque tolerável, conforme os valores aceitos como necessários à manutenção e prosperidade da Nação.  E que valores são esses? Aqueles estabelecidos pela realidade econômica e pelos embates de interesses entre as classes sociais, nos últimos séculos, desde que surgiu o capitalismo. Esses embates têm uma referência histórica marcante, no século XVIII, especialmente com as revoluções americana e francesa, alimentadas pelas ideias dos iluministas. Aquele momento histórico marcou o início de uma Era de confrontos e negociações que criaram o Estado Moderno, um período histórico de grande progresso e de grandes confrontos que foram se ampliando. No início do século XX eles se exacerbaram, dando origem às duas grandes guerras mundiais: a de 1914-1918 e a de 1939-1945.

Após esses grandes e calamitosos conflitos, parecia que a humanidade havia tomado juízo e encontrado uma forma de convivência. Houve a libertação das colônias. Surgiu nos países mais desenvolvidos, segundo o critério da produção de riquezas, um grande acordo na sociedade ocidental, o Estado de Bem Estar Social. No Oriente, as novas sociedades socialistas, da Rússia e da China, ofereciam outra forma de organização, superando as crises econômicas através da economia planejada e de distribuição de riqueza mais democrática. Mas foi criada uma dualidade que resultou na Guerra Fria, com graves consequências, inclusive pela proliferação das armas nucleares.

Mas, o mundo ocidental não conseguiu manter por muito tempo o Estado de Bem Estar Social. Este se caracteriza por uma melhor distribuição da riqueza, cujo exemplo mais marcante está na Europa, especialmente nos países nórdicos. Isso foi possível pela democratização da política e a garantia dos direitos dos cidadãos, conquistados a duras penas em embates sociais expressivos, especialmente pelo clamor dos povos massacrados pelos horrores das duas guerras mundiais. Essa condição social foi mantida pelo livre pensar e pelo diálogo, dos quais resultaram condições políticas e institucionais, nas quais prevaleciam alguns princípios republicanos, fundados na soberania do cidadão e das nações, consubstanciadas no voto popular e na autodeterminação dos povos. Para tal chegou-se a organizar uma cooperação entre os países menos desenvolvidos economicamente, a partir de uma reunião em Bandung, na Indonésia, que fundou o Movimento dos Países Não Alinhados, aqueles que não estavam aliados aos blocos Ocidental ou Socialista, portanto, teoricamente, neutros. Mas essas nações não foram poupadas de intervenções externas, especialmente para a dominação de sua produção de petróleo e para bloquear seu desenvolvimento autônomo, como aconteceu no Brasil, na Indonésia e em outros países da América Latina com os golpes de Estado que produziram sangrentas ditaduras militares.

O Estado de Bem Estar Social ainda se aguenta, precariamente, nos países mais industrializados, em parte com recursos da espoliação dos outros países. Já nos países submetidos ao neocolonialismo – o colonialismo econômico com soberania apenas nominal – a espoliação grassou, com o consentimento de governos autocráticos e corruptos. A “democracia”, – ou Estado de Direito -, duramente conquistada por esses povos, degradou-se. O capital estrangeiro dominou suas economias.

O sistema capitalista usou e continua usando esses países como áreas de expansão de seu mercado, cada vez mais cartelizado e submetido ao capital financeiro. Essa fase se agravou a partir da década de 1970, quando os excedentes de produção nos países mais industrializados ameaçava levá-los a uma crise sem precedentes. Para evitá-la, os países que detêm o controle financeiro do comércio mundial, os EUA e a Inglaterra, adotaram a política do dinheiro sem lastro, que foi imposta ao mundo. Dessa forma eles conseguiram ampliar os mercados que necessitavam, para fazer faze à nova crise do sistema capitalista que já se anunciava.

O dinheiro sem lastro, somado aos petrodólares gerados pela imposição do aumento do preço do petróleo, a partir de 1973, concentrou mais ainda a riqueza, sob a forma monetária, que precisava encontrar meios de ser remunerada. Foi imposto aos países periféricos, do ponto de visto econômico, o endividamento para promover um desenvolvimento artificial, para atender às grandes corporações empresariais. Disso resultou o slogan “Brasil grande”, no governo militar brasileiro que produziu grande aumento da dívida externa brasileira, de 2,4 bilhões de dólares, em 1964, para 85,4 bilhões de dólares, em 1985, 35 vezes maior.

Essa política neoliberal ficou conhecida como “globalização” e foi difundida como uma Era de Prosperidade. Mas seu resultado foi o empobrecimento das populações mais pobres e uma brutal concentração de riquezas na mão de poucos. Foi também a perda da soberania de muitas nações. Margareth Thatcher foi mais realista ao interpretar essa política, considerada a única solução para o capitalismo, dizendo “There is no alternative”. De fato essa foi a única opção que o capitalismo tinha para sua sobrevivência por mais algum tempo, sem uma guerra que pudesse mascarar a crise do capitalismo. Essa seria catastrófica para todos, sobretudo para os mais poderosos. Mas sua lógica não nos serve, porque nos custa nossa própria sobrevivência. Centenas de milhares de brasileiros morrem todos os anos, em decorrência dessa política macabra. Os fatos demonstram que o capitalismo esgotou-se, está em fase terminal.

O governo que temos hoje é consequência desse processo, que não é apenas um jogo geopolítico.  Ele é muito mais que isso, pois seu objetivo é de dominar completamente grande parte do mundo, numa tentativa de superar a crise do sistema capitalista. O Brasil é para eles um elemento fundamental para enfrentar a China, que tem hoje poderes para fazer face ao império americano.

Temos ainda a considerar que todos os conflitos graves que ocorreram no mundo desde a Revolução Industrial na Inglaterra, no século XVIII – da Revolução Francesa à Guerra Fria – são aspectos de um mesmo e grave problema, as crises cíclicas do sistema capitalista. Já os atuais, as guerras do Afeganistão e do Iraque, a Primavera Árabe e a guerra da Síria, as pressões sobre a Coréia do Norte, a tentativa de derrubar o governo da Venezuela, o assalto ao Pré-sal e a tentativa de desmoralizar a Petrobrás. a redução de direitos trabalhistas e a reforma da Previdência no Brasil, sãos consequências da crise terminal do capitalismo. É na análise dessa crise e de suas causas que sairá a resposta ao título desta matéria, O segredo do colapso da civilização.

 

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