O que é política monetária?


O que é política monetária?

Arnaldo Mourthé

O FMI publicou que o endividamento mundial atinge nível recorde. Eis a notícia:

“A dívida mundial pública e privada alcançou um valor sem precedentes, a ponto de ser mais do que duas vezes superior à riqueza criada no mundo, informou nesta quarta-feira o Fundo Monetário Internacional (FMI)”.

Sem contar o setor financeiro, o endividamento global no final de 2015 chegou a 152 bilhões de dólares, ou seja, 255% do Produto Interno Bruto (PIB) nominal mundial, segundo um relatório publicado pelo FMI.

“Os altos níveis desta dívida são custosos porque geralmente conduzem a recessões financeiras mais expressivas e maiores do que as recessões normais”, considerou Vitor Gaspar, diretor do Departamento de Assuntos Orçamentários do FMI.

Este aumento do endividamento corresponde principalmente ao setor privado, que aproveitou completamente a “era do dinheiro barato”, alimentado pelas políticas monetárias ultracomplacentes dos grandes bancos centrais.

“Uma dívida privada excessiva constitui um grande freio à recuperação mundial e um risco para a estabilidade financeira”, afirmou Gaspar.

Os países viram aumentar sua dívida pública e sofre também com a conjuntura econômica morosa que os impede reduzir essa carga, comentou o FMI.

A dívida do Japão alcançará 250% de seu PIB neste ano, a da Grécia 183%, enquanto a da França chegará a 100%, segundo as novas projeções do organismo.”

Mas como pode ocorrer tamanha calamidade? Por causa da política monetária instituída pelo neoliberalismo e adotada no Brasil por governos irresponsáveis com a maior desfaçatez. Mas que vem a ser essa “política monetária”.

Simplificando a questão, podemos dizer que a civilização existe pelo simples fato que o homem – devido sua racionalidade e criatividade – vem produzindo desde os primórdios de sua existência mais um pouco do que o necessário a seu consumo. Podemos chamar esse diferencial de excedente de produção. Ele pode ser utilizado das mais variadas formas, em desenvolvimento de instrumentos, objetos, construções, e na manutenção de grupos sociais dedicados a atividades diversas, que foram evoluindo no tempo em função de seus conhecimentos tecnológicos que aumentavam a produtividade e esse excedente de produção. Assim ocorreu a diversificação das atividades. Nesse processo foram sendo criadas as classes sociais, estruturas de administração e instituições de poder, que elaboraram, de acordo com suas conveniências, crenças e costumes para satisfazer seus interesses, especialmente o fortalecimento de seu poder na sociedade.

Esse excedente de produção era administrado por uma chefia, que se desenvolveu em várias formas institucionais até a que hoje conhecemos, com denominações diferentes, como reinos, repúblicas, etc., que administram os interesses da classe dominante. A partir da última metade do último milênio esse poder vem sendo monopolizado pela burguesia capitalista. O mecanismo desse fenômeno foi o fato de que no sistema capitalista o excedente de produção é concentrado nas mãos dessa burguesia, que o distribui na sociedade conforme seus interesses e as condições de desenvolvimento das forças produtivas e das forças políticas dentro da sociedade.

Isso permitiu uma acumulação de capital monumental, ao longo dos últimos séculos, não sem a ocorrência de diversos e inúmeros conflitos que vão das disputas salariais à grandes guerras, passando por todas as situações que conhecemos no presente ou através da história.

Acontece que esse sistema de apropriação do excedente de produção não ocorre sob um comando único, mas de variados grupos de interesses. A começar pela faculdade de um capitalista, por razões pessoais ou outras, não colocar no mercado, parte do dinheiro que ele acumulou, entesourando-a. Isso gera crises de estoque que, geralmente, terminam em guerras para destruir a mercadoria estocada por falta de dinheiro no mercado para comprá-la.

Quase todas as guerras entre nações, incluindo as duas grandes guerras mundiais do século XX, tiveram sua origem nas lutas por mercados para desovar mercadorias estocadas nos países mais industrializados. Outras guerras vieram, para cumprir a mesma tarefa, ou para o controle de materiais, principalmente aqueles fontes de energia, como é o caso do petróleo e do gás.

Enquanto houve mercados para a expansão do sistema e as guerras não ofereciam riscos maiores que o sacrifício de populações, o capitalismo conseguiu manter-se e desenvolver as forças produtivas, pois cada nova tecnologia permitia produzir a um preço menor, dando supremacia àquele que a adotasse. Assim o capitalismo estendeu seus tentáculos sobre o mundo e aproveitou-se do desenvolvimento tecnológico para ampliar seus domínios. Entretanto ocorreram dois obstáculos. O primeiro é a redução dos espaços para sua ampliação, que permitiam aplicar excedentes de um país em outro. O segundo é que as guerras possíveis, localizadas, como a do Iraque e a primavera árabe, já não resolvem seu grande problema de acumulação de capital. Uma guerra maior pode representar a destruição de nações inteiras, senão da própria humanidade.

Qual a solução para manter a lucratividade de seu capital acumulado? O endividamento, para mantê-lo sob seu controle e gerar ocupação e salário para comprar seus excedentes, o que veio e vem sendo feito na periferia do sistema. Mas essa solução é insuficiente, pois ela gera a inadimplência e a insegurança. Que fazer?

Criar um sistema que permitisse o lucro sem a produção de mercadorias, que precisam ser vendidas para sua realização. Esse sistema é o endividamento público. A dívida pública é uma espécie de aplicação garantida pelo patrimônio do país que não pode ser paga porque gera inflação. Se não pode ser paga, por que pode ser um bom negócio? Porque o devedor está sempre numa posição inferior à do credor. Este pode fazer exigências para não protestar o título de crédito, ou criar bloqueios econômicos, que prejudiquem o devedor. Dessa forma o endividamento privado cresce sem cessar e junto com ele vem parte do lucro do produtor capitalista ou do consumidor através do crediário.

O endividamento público não pode ser pago, teoricamente porque geraria inflação. Mas uma parte dos juros são recebidos como apropriação de parte da arrecadação pública  e outra por uma inflação dosada, através de instituições públicas geridas pelos bancos privados, o Banco Central. A outra parte transforma-se em mais títulos que aumentam de forma exponencial a dívida pública, que se torna, assim, impagável.

Mas se a dívida não pode ser paga por que ela é incentivada pelos investidores? Porque, além de ser um bom negócio, a curto prazo, sua permanência e crescimento permite a submissão de governos, que passam a aplicar a política a favor dos investidores. Uma delas é a alienação do patrimônio público e outra a vista grossa com as políticas predadoras do capital financeiro, que no plano governamental tem o nome de “política monetária”, que no Brasil é executada pelo Banco Central, através do Copom.

Em linguagem popular, podemos dizer que a “política monetária” é a bíblia do “deus-mercado”, ou seja, do “demônio”, numa religião que tem como “catedral” o Banco Central e como “altar” o Copom, que fixa os juros que avassala os governos, degrada os serviços públicos e demole a sociedade e a Nação.

Algo tem que ser feito para parar com essa brincadeira. Primeiramente rebaixar os juros e auditar a dívida pública. Se a banca reagir, suspender os juros e editar a moratória da dívida pública até que se saiba das ilegalidades que nela existem.

Rio de janeiro, 07/10/2016.

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