“Meu reino por um cavalo”


“Meu reino por um cavalo”

Arnaldo Mourthé

Este título, segundo Shakespeare, seria de autoria de Ricardo III que, jogado no chão no calor da luta, teria bradado: “Meu reino por um cavalo”. Uma fraude, já que o reino que prometia fora usurpado. Isso ocorreu durante a batalha de Bosworth, na Inglaterra, em 1485, na qual Ricardo III foi batido e morto por Henrique IV, que inicia a dinastia Tudor.

Acompanhando a desenvoltura com que a presidente Dilma anuncia a venda do nosso patrimônio que restou da ação predatória de Fernando Henrique e Lula, lembrei-me desse evento histórico. Impressiona-me como tem sido fácil para certas autoridades alienar ou conceder bens e serviços do Estado, a empresas privadas nacionais ou estrangeiras! Mas essa é outra história sobre a qual já me alonguei no meu livro “História e colapso da civilização”.

A semelhança entre Dilma e Ricardo III, não está no trono usurpado já que ela foi eleita enquanto o outro assassinou os sobrinhos para assumir o poder. A semelhança está na forma leviana de encarar suas responsabilidades no ato de governar. Para o primeiro, salvar a pele era mais importante que o reino que, aliás, não lhe pertencia. Para ela a reeleição, seu cavalo, é mais importante que as riquezas nacionais, mesma aquelas que respaldam o futuro do país e de seus filhos, como é o caso do Pré-sal, à venda através do leilão do campo de Libra.

Depois de um discurso na ONU, diplomaticamente correto, apesar de seu viés eleitoral, protestando contra a espionagem praticada sistematicamente pelos serviços secretos dos Estados Unidos e, ainda, de posar de presidente indignada pelo ultraje realmente ocorrido contra a Nação, Dilma se dirige fagueira, em companhia de alguns ministros, para uma reunião com investidores americanos, cujos anfitriões foram o banco Goldman Sachs, o Grupo Bandeirantes de Comunicação e o Metro Jornal, um jornal internacional editado em 23 países.

Nessa reunião ela apela aos investidores, com a expressão “Temos certeza de que precisamos da parceria de todos” (O Globo). Em seguida ela afirma a postura “civilizada” do Brasil que é o “respeito aos contratos”, alegando não ser uma questão de governo, mas de Estado. Toda a postura de estadista da abertura da Assembleia Geral da ONU foi substituída pela de vendedora de fundo de negócios para equilibrar a caixa da sua empresa. Para ela e seus ministros, o negócio é arrecadar com as concessões governamentais mais de US$ 200 bilhões para tapar os buracos da política econômica irresponsável que vem sendo adotada desde a posse de Fernando Henrique na Presidência até nossos dias. Essa política que desmoronou nossas finanças e nossos serviços públicos, e endividou enormemente o Estado, foi obra dos próprios investidores internacionais a quem Dilma agora faz apelo para salvá-la. Os franceses têm uma expressão interessante para definir essa atitude: “Fuite em avant”, fugir para frente.

Dilma tenta sair da esparrela em que caiu pedindo socorro aos mesmos que levaram o país às dificuldades de hoje, que só se agravam. O pior é que o faz comprometendo o futuro do país, entregando a irresponsáveis predadores o restante dos serviços públicos que o Estado administra e a maior riqueza que o Brasil pode dispor para o futuro próximo, o petróleo do Pré-sal. Tudo apenas por míseros recursos para tapar buracos enquanto seus marqueteiros ganham a eleição para ela. E, para isso, se compromete que a Nação cumprirá o contrato, seja com quem for: “Meu reino por um cavalo”. Ela repete a tragicomédia protagonizada por Ricardo III, sem pelo menos ouvir quem quer que seja da população brasileira que não tenha compromisso com seu governo ou com o banquete que o capital financeiro oferece diuturnamente a seus sócios e sequazes.

Presidente Dilma, à senhora não foi conferida a autoridade para alienar o patrimônio nacional, nem submeter o nosso país aos interesses do capital financeiro, muito menos do internacional, predador, sem pátria e promotor permanente de guerras e genocídios. Seu mandato não inclui o direito de agir contra o interesse nacional ou contra qualquer cidadão em particular. Tentar fazer isso para permanecer no cargo, ou por qualquer outra razão, é crime de responsabilidade, que pode ser punido com a perda do mandado e outras penalidades. Ninguém é obrigado a acatar sua promessa de cumprimento de contrato que todos sabemos leoninos, a começar pelas reformas legais que os possam permitir, enquanto o véu da obscuridade encobre as consciências do nosso povo. Essas reformas legais que permitiram as privatizações nos moldes praticados por nossos governos são ilegítimas, pois foram obtidas através da corrupção. Qualquer cidadão pode contestar os contratos lesivos aos interesses nacionais que os últimos governos têm praticado.

Diante de tudo isso eu declaro solenemente, perante a Nação e a quem se interesse, que eu, autor deste artigo, não aceito que nossa Presidente aliene os campos de petróleo do Pré-sal, e não respeitarei qualquer contrato que seja feito direta ou indiretamente com empresas estrangeiras. Esta é uma declaração de desobediência explicita por objeção de consciência.

Caso o leitor queira incorporar uma figura histórica a este ato político de escrever este artigo, sugiro a de Arariboia, chefe dos índios temiminós, que ajudou os portugueses a expulsar os franceses da Baía de Guanabara: “Esta terra tem dono”. Seu dono é povo brasileiro.

Rio de Janeiro, 27 de setembro de 2013

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